As defesas cabíveis ao desconsiderado após o acolhimento do pedido de desconsideração da personalidade jurídica

A técnica é eficaz na cobrança de dívidas, mas gera controvérsias sobre os direitos de defesa do terceiro responsável.

A desconsideração da personalidade jurídica tem sido uma das técnicas mais utilizadas e efetivas no âmbito da recuperação de crédito, provocando diversas discussões processuais, mas nem todas as discussões abordando assuntos mais sensíveis e que ainda não possuem regramentos claros, permitindo, assim, a prolação de decisões conflitantes sobre os mesmos temas.

Alguns destes temas, por exemplo, são os meios de defesa cabíveis ao responsável patrimonial incluído no polo passivo de execuções ou cumprimentos de sentença após a aplicação do disregard doctrine em seu desfavor.

Se por um lado é inequívoco que o desconsiderando possui o direito de resistir ao pedido de sua responsabilização por dívida alheia, o que notoriamente se dá no âmbito da discussão de sua legitimidade, comumente realizada por meio de um incidente processual, há controvérsia quanto ao seu interesse e legitimidade, por exemplo, para opor embargos à execução ou impugnar cumprimentos de sentença após o estabelecimento de sua responsabilização.

Há quem sustente, ao adotar a teoria dualista da obrigação e considerar o desconsiderado como mero responsável (Haftung) pelo débito (Schuld), que não seria possível que um terceiro, que não participou da formação da relação obrigacional, discuta questões relativas a encargos contratuais, multas penais, dentre outras matérias.

Entretanto, considerando que tais matérias influenciam no cálculo da dívida e que o desconsiderado responderá por ela com seus bens, parece-nos desarrazoado limitar a defesa do terceiro neste tocante.

Mesmo assim, o momento em que o terceiro passa a integrar a relação processual executiva e os atos já praticados pelos devedores originários devem ser observados para a definição das defesas cabíveis ao desconsiderado.

Isto porque, já tendo sido proferida sentença transitada em julgado julgando improcedentes os embargos à execução opostos pelos devedores originários, por exemplo, nos parece ser inadmissível que o desconsiderado possa manejar novos embargos à execução, rediscutindo matérias já decididas. Inclusive o STJ1 já decidiu nesse sentido.

É que o devedor originário possui legitimidade extraordinária para defender os interesses do desconsiderado em nome próprio, de sorte que, a sentença que julga os embargos à execução opostos pelo devedor originário também produz efeitos aos outros executados, incluindo o terceiro responsabilizado pelo débito após o acolhimento incidental de pedido de desconsideração da personalidade jurídica.

Assim, caso o devedor originário já tenha oposto embargos à execução, não se deve permitir ao desconsiderado o oferecimento da mesma defesa, diante da litispendência ou coisa julgada formada, prestigiando o princípio da segurança jurídica.

Vale também pontuar que mesmo que sejam partes diferentes, tratando-se de um litisconsórcio unitário, a coisa julgada se forma mesmo presentes apenas a identidade de pedidos e causas de pedir, como já decidiu o TJ/PR2 e o TJ/RS3 ao extinguirem sem resolução do mérito embargos à execuções opostos por coexecutados, buscando rediscutir temas já enfrentados e arguidos por outros devedores.

Todavia, entendemos que, ainda que não tenham sido opostos embargos à execução pelos devedores originários, caso o momento processual para tanto já tenha sido superado quando da aplicação da disregard doctrine, as partes atingidas pela desconsideração não poderão se valer de tal defesa.

Tal conclusão decorre da premissa máxima de que a parte atingida pela desconsideração da personalidade jurídica integra o feito executivo no estado em que se encontra, sendo inviável a retomada de etapas processuais já superadas, conforme precedentes do TJ/SP4 5.

Portanto, não se tratando de hipótese na qual o pedido de desconsideração da personalidade jurídica é formulado na petição inicial, mas de forma incidental, entendemos que somente seria viável a oposição de embargos à execução ou o oferecimento de impugnação ao cumprimento de sentença caso a disregard doctrine seja acolhida antes do decurso do prazo para os devedores originários se valerem das defesas mencionadas.


1 STJ – REsp: 1978261/SP (2020/0257364-9), Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Data de Julgamento: 05/04/2022, Terceira Turma, Data de Publicação: DJe 08/04/2022.

2 TJ/PR – APL: 0006547-32.2019.8.16.0014 (Acórdão), Relator: Roberto Antonio Massaro, Data de Julgamento: 25/03/2022, 13ª Câmara Cível, Data de Publicação: 29/03/2022.

3 TJ/RS – AC: 70055698286 RS, Relator: Gelson Rolim Stocker, Data de Julgamento: 15/08/2013, Décima Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 26/08/2013.

4 TJ/SP – Agravo de Instrumento: 2097312-68.2025.8.26.0000 São Paulo, Relator: Pedro Kodama, Data de Julgamento: 06/09/2025, 37ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 06/09/2025.

5 TJ/SP – Agravo de Instrumento: 2227446-86.2025.8.26.0000 Bebedouro, Relatora: Claudia Grieco Tabosa Pessoa, Data de Julgamento: 12/09/2025, 19ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/09/2025.

Fonte da matéria: https://www.migalhas.com.br/depeso/443205/defesas-possiveis-apos-desconsideracao-da-personalidade-juridica

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